A todo momento, alardeia-se que a temporada de navios de turismo é um sucesso. Há dez anos, eram pouco mais de 100 mil passageiros, e, para a atual, que vai até maio, estão previstos 884 mil pessoas, em 20 navios, todos estrangeiros. Fala-se em entrada de dólares e gastos nos pontos de atracação, mas tudo é contestado. Aproveitando-se do frio no Hemisfério Norte – o que os obrigaria a ficarem paralisados – os transatlânticos atracam no Brasil, mas operam quase que exclusivamente com turistas nacionais. A percentagem de estrangeiros é inferior a 10% e, portanto, não ocorre a esperada entrada de divisas. Quanto aos gastos dos passageiros em terra, que seriam de US$ 200 por dia, por passageiro, o dado é contestado por agentes de turismo e donos de restaurantes.
Três setores são mais duros ao questionar os cruzeiros: os marítimos, a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) e entidades ligadas aos consumidores. O presidente do Sindicato dos Oficiais de Marinha (Sindmar), Severino Almeida, destaca que, em geral, a costa brasileira é restrita a navios nacionais, mas, para turismo, foi dada inexplicável exceção através da Emenda Constitucional 7, de 1995. Almeida critica o fato de só haver necessidade de uso de marítimos brasileiros após 90 dias em águas nacionais, porém uma simples atracação em portos vizinhos de Uruguai e Argentina dá condições à embarcação de retornar ao litoral brasileiro sem aqui gerar empregos. “O Sindmar entende que o turismo marítimo deve estar atrelado à geração de empregos para brasileiros, além de estimular encomendas a estaleiros nacionais”. Para o Sindmar, deve haver fiscalização rígida sobre qualidade de alimentos e até sobre lançamento de esgoto desses navios, fatos que têm levantado dúvidas.
Brasileiros contratados para outras funções a bordo, até recentemente, eram considerados sem direitos pelas empresas de cruzeiros. No entanto, recente decisão do Superior Tribunal de Justiça impôs que contratos feitos pelos transatlânticos, com domicílio em pequenas ilhas-países, são inválidos, ou seja, o STJ concluiu que a justiça do trabalho é competente para julgar questões de brasileiros com esses navios – sempre registrados em paraísos fiscais. Diz uma fonte da Federação Internacional dos Trabalhadores em Transportes (ITF):
“Camareiras, músicos, garçons, recreadores, trabalham até 18h por dia e, por medo de não obterem renovação, aceitam as imposições”. A Antaq informa que controla todo tipo de embarcação na costa brasileira, exceção feita aos transatlânticos, que gozam de direitos especiais, injustificados.
No último Natal, registrou-se o caso do MSC Musica, que não deixou o Porto do Rio, por problemas com o ar condicionado. Segundo a ONG Férias Vivas, já houve casos de médicos de bordo que não falavam português. Um dos problemas mais constantes têm sido as intoxicações a bordo, o que tem gerado reclamações na justiça do Rio, São Paulo e outros locais do país. Em suma, como diz Severino Almeida: “Não se pode ter um segmento em que o glamour e o enriquecimento fiquem com os estrangeiros e os problemas com os brasileiros. Os transatlânticos devem ter ônus e bônus do mercado brasileiro, não apenas direitos”.
Fonte da matéria: Jornal Monitor Mercantil